Neste espaço se divulga a actividade do grupo restrito CantOrfeu.

domingo, 21 de novembro de 2010

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Jorge Vicente * Uma ausência

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Jorge Vicente



Uma ausência...

Uma ausência sem poder
mas que destrói o corpo
e o corrói numa cauda
cintilante de cobra


uma ausência que teme
o amor - a presença farta
dos frutos alimentando
o humano

uma ausência que ferve
e não é em mim,
mas pode ser em ti,
ave do céu sem poiso

uma ausência sem humanos,
sem cantos vivos, sem lobos
baloiçando no que nasce
e no que reluz

uma ausência que não quero
porque o amor é feito
de presença,
de pão amado e partilhado
entre os homens.

sábado, 20 de novembro de 2010

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Lílian Maial * Soneto da Saudade

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Lílian Maial
SONETO DA SAUDADE *

Como o sol, atrás de nuvens carregadas,
o teu brilho nos meus olhos se apagou.
E esse véu, que a tua ausência me deixou,
não impede que essa luz seja espalhada.
*
Como lua solitária e abandonada,
sigo a trilha que o cometa rabiscou.
E o meu céu, que outrora riu, hoje chorou,
dando forma à nova estrela apaixonada.
*
Tantas lágrimas brindaram a tua ida,
tantas noites o meu peito soluçou,
sem amor, agora tão pela metade...
*
Sou pedaço de um planeta suicida,
numa órbita febril que alguém traçou,
colidindo com o vazio da saudade.



* "Soneto da Saudade" é a segunda participação de Lílian Maial nesta nossa I Ciranda CantOrfeu.

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Nathan de Castro * Ausência

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Nathan de Castro



AUSÊNCIA


Eu sei do meu silêncio em cada verso,
cantando a tua ausência ponto a ponto,
e quando ele reclama eu desconverso,
versando uma mentira conto a conto.

E ponto a ponto aprendo o meu reverso
no inverso do universo: o desencontro,
e conto a conto o grito submerso
emerge e canta: — Eu quero o sonho pronto!

De louco a louco pinto estes sonetos,
para que um dia o verso aprenda a flauta
no sopro agoniado do argonauta...

De sol a sol, nas ruas dos meus guetos,
rabisco estas canções em branco e preto
para encantar a Estrela que me falta.


05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * José-Augusto de Carvalho * Ausência de mim

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
José-Augusto de Carvalho


Ausência de mim

.
Ai, quantas vezes, e me cansa tanto!,
eu dou comigo a perguntar por mim!...
Que estranhas dúvidas em mim levanto?
Que mais importa? O se ou por que vim?
.
No chão, a sombra que desenho, errando,
num sortilégio, desconstrói o nexo.
Difusa sombra, desafia o quando
e o como além do meu estar perplexo!...
.
De sul, a brisa acaricia, mansa.
A natureza, adormecida, sonha...
Apenas eu, nesta evasão que cansa,
cansado espero o que o devir disponha.
.
Ah, e depois de definido o rumo,
que eu arda todo e me desfaça em fumo!

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Tuphy Mass * Ausência

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)

Talvez Tuphy...
*
Ausência
Amine


Quando Amine trazia o perfume dos dias,
que esplendor do devir em abril florescia!

Era abril-primavera ensinando a cantiga
da esperança a cumprir a perene oração...
Era o tempo de ser a promessa da espiga
que madura será a fartura do pão...

Neste tempo de agora, esfumou-se o perfume.
Só o vento suão enternece o vazio,
na vigília do tempo, em golfadas de lume
e lampejos de luz aquecendo este frio.

E eu porfio doendo a saudade dos dias,
nesta ausência de Amine em auroras de espanto!
E eu porfio no tempo em que Abril florescias,
num poema de amor que entre lágrimas canto...

Al Andalus, 3/8/2010.

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Luzia Magalhães Cardoso * Ausência

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)

Luzia M. Cardoso



Ausência
Eu sinto o outono e chovo, agora,
lágrimas tristes, que logo te imploram
nutrir a flor, com perfumes d'outrora,
que jaz num canto das brumas qu'afloram.
*
E o vento leste daqueles momentos
traz na saudade esse frio cortante,
que seca as folhas de meus sentimentos,
e mata os sonhos, nesse breve instante.
*
Doces lembranças das ondas do mar,
brasas ardentes em mantos fundidos
que iam ao céu, em galopes de amar.
*
Queria ouvir muitos roucos gemidos
abrindo a pauta de minha existência,
mas hoje eu solo apenas ausência.

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Lílian Maial * E chorei, como há muito não chorava...

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Lílian Maial


E CHOREI, COMO HÁ MUITO NÃO CHORAVA...


E a noite veio, como qualquer outra,
mais doce a vinda, que o amargo fim.
E não há fogos nessa noite oca
e nem presente mais presente em mim.
*
Os risos falsos a cortar a boca
garantem brilho em olhos de cetim.
Embora a corda não condene à forca,
ver o pavio me acende o estopim.
*
No peito sóbrio, a embriaguez rondava,
pelos soluços vãos que alma armava,
como a engolir lembranças do passado.
*
E os meus fantasmas, memórias que escondo,
a proteger-me do mundo de assombro,
postos à mesa, com lugar marcado.

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Eliane Couto Triska * Reverberações

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Eliane Couto Triska



Reverberações

Está dentro de mim... Não quer falar,
Trazida por inquieta vã procura.
O sonho faz poeira ao recostar
No corpo a sós... Inútil criatura!

Está dentro de mim... Que o dia a veja!
Só eu a velo ... E, ao morrer, coitada,
Finge à vida e ao dia que a deseja
E volta à terra assim, inacabada.

Comigo é má, mas sua sorte é pouca.
Que céu enviaria um emisssário
Sem idade... sem cor... sem uma roupa?

Quis o silêncio tanto... Que importou?
Só fez ausência, ali, onde o glossário
Deu voz a esse nome que eu sou.


Canoas, agosto de 2010

terça-feira, 16 de novembro de 2010

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Lizete Abrahão * Rasgos de ausências

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)

Lizete Abrahão


Rasgos de ausências


Meu corpo nu, arrepiado, tremendo,
Teu corpo pede para o aquecer.
Do céu, o orvalho cai umedecendo
A flor de mim, sem fruto por nascer.

Eu, muda e triste, deito-me sozinha...
(Ah! Os lençóis ainda com teu cheiro)
Apago a luz, tua é a pele minha,
Dou asas às sombras do meu roteiro.

Ó sonhos que já vão indo-se embora!
Eu toda sou o vinho que o sacia...
Vejo uma estrela que lá no céu mora...
Mas, num riscar, a noite se esvazia.

E, toda lume, em brasas, incontida,
Rasgou-me tua ausência... dormi, vencida...

05.01 - I CIRANDA CANTORFEU * Maria da Graça Almeida * Ausência eterna

I Ciranda CantOrfeu
(Setembro de 2010)
Maria da Graça Almeida

Ausência eterna

A morte


cala a vida,

cerra a fala,

leva à vala.

É entrada

sem saída.


A vida louva

a lida,

leva sovas,

cava a cova.

É o começo

da partida.


A morte embala

a ausência eterna,

trava-língua

sem berço,

sem braço,

sem tato,

halitose

que nas narinas

entranhada

embaça a visão,

lanha o olfato.


A linguagem da morte

é incompreensível

e para sempre

inconquistável,
intraduzível,

imaterial...

Ponto final!