Neste espaço se divulga a actividade do grupo restrito CantOrfeu.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

07.01 - Parcerias * José-Augusto de Carvalho / Lizete Abrahão



Tempo de espera

José-Augusto de Carvalho


Quando a lágrima vem e desliza
No meu rosto cavando o seu leito,
A saudade é de sal e de brisa
Nesta angústia a doer-me no peito.

Olho o barco do sonho desfeito
Que a memória ferida exorciza:
Que fantasma, a rasgar o meu peito,
Mais e mais a saudade enraíza.

Não há tempo de fel que me dome.
Neste tempo outro tempo se gera
P’ra que a vida o seu rumo retome.

Que este tempo de fel e de espera
Ganhe ao verde esperança o seu nome
E me torne outra vez primavera!


12 de Setembro de 2011.
Viana*Évora*Portugal

***
 
No tempo que espero

Lizete Abrahão

 
Foi-se o tempo. Entre as fendas do muro
Correm lágrimas puras ao léu;
Do meu sonho acordei, mundo escuro,
Já morrera a manhã do meu céu...

A saudade cravou-se em meu peito
Como lenho na beira da cova;
Bebo o fel em que o vinho foi feito
E o amargo entre os dias me prova.

Quero um beijo com gosto de mar,
Uma flor-esperança, uma taça
E um poeta no cais a cantar...

Vou provar desse sal em teu rosto,
Dos olores beber e ser graça,
Para em verso sentir o teu gosto...


Porto Alegre/RS
12.09.2011

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

02.08 - Poetas * Tuphy Mass * Al Andalus

Alhambra de Granada

Na nostalgia, sangra a dívida da história.
Dos campos do Alentejo aos campos de Granada,
ginetes de luar, correndo à desfilada,
esventram o silêncio exausto da memória.

Que fonte de água pura ensaia a melopeia
em versos de cristal e lendas do Levante?
Ai, onde, Al Andalus, o aedo que te cante,
em noites de ternura e véus de lua-cheia?

As hostes infernais mataram o poeta
e a noite recusou ensanguentar o dia
que havia de nascer e nunca mais nasceu...

A mácula de sangue os campos atapeta.
Não mais, pela manhã, cantou a cotovia.
De luto a Poesia, a lira emudeceu.


16.8.2011.

domingo, 11 de setembro de 2011

02.10 - Poetas * Herculano Alencar * Primavera de Vivaldi

A flor que ora afoga a partitura
no rio de perfume que lhe sobra,
assina a autoria desta obra,
com um rabisco posto na pintura.

A poesia envolve, qual moldura,
o céu que anuncia a primavera,
enquanto este poeta, em vão, espera
apor ao quadro sua assinatura.

A música viaja e eu, debalde,
procuro, sob o rastro de Vivaldi,
um verso que fugiu do pensamento.

E enquanto a primavera se anuncia,
meu coração, contrito, silencia
e ouve a eternidade do momento.

sábado, 10 de setembro de 2011

02.10 - Poetas * Herculano Alencar * Bolero-Ravel


A hora da verdade se aproxima!
Já ouvem-se os ruflares dos tambores!
Sua atenção, senhoras e senhores,
o verso encontrou-se com a rima!

Ravel pôs a marchar a obra prima
por onde quer que exista um peregrino
a carregar no ombro um violino,
qual uma espada pronta pra esgrima.

Quem disse que a verdade não tem hora
morreu sem ver as luzes da aurora
anuciar o sol que vem ao céu.

Morreu sem perceber a poesia
marchar por sob a luz da luz do dia
à sombra do bolero de Ravel.

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

02.14 - Poetas * Geraldes de Carvalho * Brincando



Nem quero pensar

Hoje quero brincar com a palavra amor .
Ver como fica
virada ao revés .

Virá-la também
da cabeça para os pés.

Ver como é que
parecerá
assim
suspensa no ar
ou chutada de veras
sem alguém
a apanhar .

Deixá-la cair
no chão
seria bom!

Vê-la triste
magoada
a chorar.

Que boa vingança
seria, seria.

Nem quero pensar.
Nem quero pensar.
 

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

07.02 - Parcerias * Nos versos da canção / Ao som de um feitiço * Tuphy - Amine

Orfeu e Eurídice

Nos versos da canção
Tuphy

Silêncios de magia haurindo este momento
Irrompem da penumbra, altar do esquecimento.

Dedilho a minha lira, em noites de luar.
E os versos da canção, de mel em seu dulçor,
Entoo devagar, num tímido cantar
Que vai além de mim, buscando o teu candor…

Ebúrnea, a Lua ensaia um cálido sorriso.
E eu fico, enfeitiçado, ousando perceber
O que há mais para além do mágico impreciso
Que agita docemente o meu acontecer.

E um novo amanhecer a Leste se anuncia.
Florescem arrebois nos versos da canção…
Ai, que feitiço antigo agora me inebria
E em fogo queima o meu rendido coração!

Al Andalus, 1 de Setembro de 2011


*****

Ao som de um feitiço

Amine

أمير المؤمنين

 
Aos versos da canção, uma estrela acordou,
E a sombra que pairava em meu olhar voou...

Foi tua lira e teu cantar de acordar astros
Que fez o meu anseio de soprar solfejos
Ventar na noite cálida, sobre teus rastros,
Caminho de delírio onde danço desejos.

No raro alvor, magia bordando ventura,
Suave a voz que me encanta e enfeitiça o horizonte.
Além de ti, mais nada. Nem essa lonjura
Apaga os sons do canto que me fizeste fonte.

E, quando o sol alçar seus primeiros rubores,
Os véus que cobrem de bemóis meu corpo e sono,
Nas mãos da manhã, senhora furta-cores,
A lira guardarão em saudoso abandono.


Porto Alegre/RS
01.09.2011


sexta-feira, 2 de setembro de 2011

07.02 - Parcerias * Manhã * Tuphy - Amine


Manhã

Tuphy
Al Andalus

 
Uma trémula gota de orvalho
dessedenta a manhã
que em teus lábios sabor de romã
busca doce agasalho.

E eu desperto no alvor
dos teus olhos nascendo o meu dia
que no doce sabor
de romã que se dá se extasia...
 
E esta sede que queima mitigo
em teus lábios sabor de romã,
dia a dia, no alvor da manhã
que tu és e partilhas comigo...


22.Agosto.2011

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Manhã

Amine
أمير المؤمنين

 
Um sabor enfeitiça a manhã
que ainda guarda, de outroras,
o teu beijo orvalhado de maçã,
gotejando demoras.

E as manhãs dos meus dias
se refazem nas gotas de esperas,
pois que orvalhas, deveras,
minhas pétalas, como carícias...

Minha sede, o que resta, mitigo
na doçura de cada manhã,
quando acordo ao sabor da maçã
que, em meu sonho, partilhas comigo.