Rio Guadiana, "O pulo do lobo"
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Lua Nova era o meu nome
de registo de campanha
quando resistia à fome
lá para a raia de Espanha
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Clandestino até no lar,
nem à mulher concedia
saber qual o meu andar
ou ao certo o que fazia.
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Aos trabalhos da lavoura
me entregara de menino.
Outra sorte melhor fora,
mas tive esta por destino.
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Neste saber várias artes,
saltava de galho em galho.
Em qualquer de tantas partes,
tinha agasalho e trabalho.
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De empreitada, ali ceifava;
mais além, era a cortiça;
nos tempos mortos, parava
e dava o corpo à preguiça.
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Sempre com desembaraço,
a minha jorna suava.
Nunca neguei o meu braço
à tarefa que acertava.
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Ah, mas num dia azarado,
e quem os não tem na vida?,
fiquei incapacitado
para a minha dura lida.
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Experto entre tantas liças,
eu já conhecera mundo…
Sabia até que a cortiça
boia e nunca vai ao fundo!...
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Sob a manta de maltês,
andava de monte em monte;
rasgava, de quando em vez,
as trevas deste horizonte.
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Passava a salto o Guadiana,
entrava em terras de Espanha…
A Guarda Fiscal se dana
e grita: ninguém o apanha?
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Ia e vinha, sempre a pé,
a noite me protegia…
Cada carga de café
boa féria me rendia…
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Lua Nova, a minha alcunha,
deu rimance popular.
Até eu fui testemunha
de tanto o ouvir cantar…
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Lua Nova é uma lenda,
o Alentejo é um destino;
não há aqui quem se renda,
às claras ou clandestino.
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Apanhá-lo quem se atreve?
Quem consegue tal façanha?
Em Portugal é pé leve
e pé leve é em Espanha!
/
Aquém ou além Guadiana,
desmonta qualquer ardil:
a Guarda Fiscal engana,
engana a Guardia Civil…
/
Entre limpas e montados,
astuto também engana
o ardis sempre aprontados
p'la Guarda Republicana.
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Lua Nova, morto ou vivo,
hoje é já a lenda viva
que serve de lenitivo
à vida sempre cativa.
/
José-Augusto de Carvalho
Lisboa, 26
de Novembro de 2012
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